Remuneração de dirigentes de OSC pela prestação de serviços técnicos.
A possibilidade de remunerar dirigentes de instituições sem fins lucrativos, que gozam de incentivos tributários, é um tema controverso e a legislação sobre o assunto, embora tenha sofrido melhorias, ainda não é satisfatória, gerando muita insegurança jurídica.
Embora existam diversas iniciativas do setor com vistas a melhorar a legislação, enquanto não há nada concreto, as entidades imunes e isentas ficam sujeitas às interpretações, muitas vezes restritivas, das autoridades fiscais, que foi o que ocorreu recentemente com a publicação da Solução de Consulta n.º 136/2023 da Coordenação-Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil (“COSIT”), com o entendimento de que as entidades imunes e isentas não poderiam remunerar seus dirigentes por serviços técnicos prestados.
Atualmente estão vigentes duas regras para a remuneração de dirigentes por entidades imunes e isentas.
Entidades isentas e imunes que não tenham o CEBAS (art. 12, da Lei n.º 9.532/1997):
- É vedada a remuneração, por qualquer forma, de dirigentes, pelos serviços prestados;
- É permitida a remuneração de dirigentes por associações, fundações ou organizações da sociedade civil, sem fins lucrativos, desde que os dirigentes atuem efetivamente na gestão executiva;
- É permitida a remuneração de diretores não estatutários que tenham vínculo empregatício;
- A remuneração dos dirigentes estatutários deve observar as seguintes condições: ser inferior a 70% (setenta por cento) do limite de remuneração dos servidores públicos federais; o dirigente não pode ser cônjuge ou parente de instituidores, sócios, diretores, conselheiros, benfeitores ou equivalentes; e o total pago para os dirigentes não pode ultrapassar 5 (cinco) vezes o valor do limite individual; e
- É permitido que o dirigente tenha vínculo estatutário e empregatício e seja remunerado por essas duas funções cumulativamente.
A legislação não é clara a respeito da aplicação das regras das letras “c”, “d” e “e” acima para as entidades isentas, mas algumas soluções de consulta COSIT interpretam como sendo aplicáveis.
Entidades imunes com CEBAS (Lei Complementar n.º 187/2021):
- É vedada a remuneração dos dirigentes estatutários, conselheiros, associados, instituidores ou benfeitores remuneração, vantagens ou benefícios, direta ou indiretamente, por qualquer forma ou título, em razão das competências, das funções ou das atividades que lhes sejam atribuídas pelos respectivos atos constitutivos;
- É permitida a remuneração de diretores não estatutários que tenham vínculo empregatício; e
- A remuneração dos dirigentes estatutários deve observar as seguintes condições: ser inferior a 70% (setenta por cento) do limite da remuneração dos servidores públicos federais; o dirigente não poder ser cônjuge ou parente de instituidores, sócios, diretores, conselheiros, benfeitores ou equivalentes; e o total pago para os dirigentes não pode ultrapassar 5 (cinco) vezes o valor do limite individual.
Vale ressaltar, que o objetivo da legislação deveria ser evitar abusos, de modo a configurar a distribuição disfarçada de lucros para dirigentes.
A Consulta foi formulada por uma associação civil sem fins lucrativos, que atua no ramo de defesa dos direitos sociais, a qual questionou se poderia remunerar dirigentes que a ela prestam serviços técnicos específicos, que não sejam de gestão da associação, sem que isso afete sua condição de isenta ou de eventual imunidade, considerando, ainda, eventual qualificação como OS ou OSCIP.
Na sua resposta, a Receita Federal menciona a Solução de Consulta COSIT n.º 275, de 26 de setembro de 2019, para trazer o conceito de dirigentes, que seriam àqueles profissionais, tanto estatutários, quanto celetistas, que, de fato, exercem determinado cargo de liderança, com poderes para administrar, conduzir e dirigir a instituição, por meio da tomada de decisões e da fiscalização quanto ao cumprimento de diretrizes estabelecidas.
Na sequência, ao interpretar o artigo 12, da Lei n.º 9.532/1997, entende que somente é permitido remunerar dirigentes em duas situações:
- Dirigentes não estatutários que tenham vínculo empregatício com a entidade; e
- Dirigentes estatutários pelo exercício de atribuições estatutárias.
Dessa forma, conclui que a hipótese questionada, ou seja, a remuneração pela prestação de serviços técnicos amparada por contrato civil ou comercial, por meio de sociedade limitada unipessoal ou na condição de empresário individual, microempreendedor individual ou como profissional autônomo, para atuar, por exemplo, como consultor, não está permitida na legislação.
Segundo a Receita Federal, a regra geral é a vedação à remuneração aos dirigentes, sendo permitida exclusivamente nas exceções legais estabelecidas. Assim, “toda e qualquer situação não expressamente prevista nessas normas tributárias não autoriza a remuneração do dirigente sem prejuízo da isenção, uma vez que sua interpretação precisa ser literal”.
Menciona, ainda, que as legislações que tratam da qualificação das entidades como OSCIP ou OS não modificam a regra prevista na Lei n.º 9.532/1997, mantendo-se o entendimento acima.
Com base nisso, a resposta dada pela Receita Federal é que não seria considerada isenta ou imune do IRPJ e da CSLL a entidade que remunera dirigentes pela prestação, a si própria, de serviços técnicos específicos sem amparo em vínculo estatutário (de gestão executiva em sentido lato) ou empregatício.
A Solução de Consulta emitida pela COSIT tem efeito vinculante para a Receita Federal, o que pode gerar um risco para as entidades que adotam uma prática em desacordo com o entendimento.
Dessa forma, entidades sem fins lucrativos isentas ou imunes, independentemente de qualquer qualificação, que, atualmente, remunerem os seus dirigentes por serviços técnicos específicos, sem vínculo empregatício, podem estar sujeitas à suspensão de seus benefícios fiscais em eventual fiscalização por auditores da Receita Federal do Brasil, o que poderia gerar a autuação fiscal para pagamento do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS em relação aos 5 (cinco) anos anteriores.
Portanto recomenda-se tomar eventuais providências para evitar riscos tributários, por meio de revisão de procedimentos internos ou de discussão judicial.